foto: Pedro Santana

domingo, 6 de janeiro de 2013

LIÇÕES DO TEMPO

       A notícia veio no final da manhã. As emissoras da EPTV deveriam produzir uma série especial de fim de ano e a praça de São Carlos não ficaria de fora. Durante a reunião, a equipe escolhida para desenvolver o projeto conheceu a pauta: as lições do tempo. Uma ideia do gerente de jornalismo, Pedro Varoni. Na hora, me deu um frio na barriga. Um assunto abrangente, abstrato e complexo. Como traduzir tudo isso para a linguagem da televisão? Começamos a pensar e a roteirizar capítulo por capítulo. Surgiram muitas dúvidas e divagações - mas, acima de tudo - a vontade de enfrentar um novo desafio.
      Fomos atrás de personagens que pudessem contar como lidavam com o tempo, nos mais diversos sentidos. A estratégia foi criar metáforas para tornar o assunto mais palpável. As conquistas da nossa vida parecem, por exemplo, com a construção de uma casa. Cada tijolo assentado é um pequeno esforço para um objetivo que, uma vez alcançado, dá lugar a outros planos... Vivemos semeando projetos, mas entre o plantar e o colher existe o tempo de espera. O problema é que muita gente não tem paciência e fica ansiosa com aquilo que nem aconteceu. Alguém encontra tempo pra viver o hoje?
      Por ser um assunto abstrato, as entrevistas foram difíceis. Mesmo assim, em vários casos, a conversa fluiu. Durante estes encontros, descobrimos histórias como a de dona Rosa, costureira que se reinventou e voltou a trabalhar depois de 10 anos afastada por causa de uma depressão. O desenrolar da vida não foi fácil, mas ela soube recomeçar um projeto. A entrevista com o médico e escritor Sérgio Pripas, autor do livro "Cronos ensandecido", também foi bastante esclarecedora. Ele chamou nossa atenção para uma nova visão de mundo. Precisamos sempre levar o tempo a nosso favor.
      Como tudo no jornalismo, o trabalho em equipe foi fundamental. Certamente, o número de acertos superou o de erros. Todos navegaram no mesmo barco: Antonio Simonetti (editor de imagens), Juliana Brunório (pauteira), Fabio de Souza (auxiliar técnico), Kelly Godoy (editora de texto, uma grande companheira) e, claro, nosso repórter cinematográfico Pedro Santana.

      As imagens colhidas por ele são de tirar o fôlego. Mas o caminho para chegar até elas foi cheio de obstáculos. Produzir uma boa imagem também exige paciência. Com muita dedicação, Pedrinho ficou horas esperando uma flor desabrochar. As marcas do tempo foram reveladas pelo olhar sensível deste talentoso profissional. As folhas secas, a pele envelhecida e os galhos retorcidos mostram que tudo passa muito rápido. É preciso aproveitar cada instante da vida. Foi justamente o que nós fizemos. Em cada contato com as pessoas e a natureza, procuramos tirar uma lição.
      Foram vários ensinamentos. As reportagens despertaram em mim uma grande reflexão. Tudo tem o tempo certo, mas nem sempre conseguimos entender isso. Eu mesmo semeei durante anos o projeto de ser repórter, mas em vários momentos fiquei revoltado e impaciente. Até que a hora chegou e eu encontrei forças para me reinventar. Mudei de cidade e de emprego duas vezes. Deixei amigos e parentes. Um novo ciclo começou. Justamente o que também aconteceu com os personagens da série especial. E eu sei que, um dia, uma nova fase vai chegar. É a mágica da vida. Depois desta grande lição do tempo, espero encarar os próximos desafios com muito mais confiança! Que surjam novos caminhos...

      Obrigado também aos amigos que viram de perto este nosso esforço e acompanharam a série especial. Abaixo, seguem as matérias e o álbum com algumas fotos tiradas durante as gravações:

Álbum - Lições do Tempo

Cap. 1 - Começar, terminar e recomeçar
Cap. 2 - Aprender com os mais velhos
Cap. 3 - Semear, colher e o tempo da espera
Cap. 4 - Chegadas e partidas
Cap. 5 - Viver o hoje

domingo, 1 de abril de 2012

Rumo à reportagem: lembranças biográficas

     Foram 9 anos em busca de um espaço onde eu pudesse, efetivamente, fazer reportagens. Desde o primeiro ano da faculdade de jornalismo, minha vontade era ser repórter. Senti esse prazer, pela primeira vez, durante uma incursão na comunidade de Heliópolis, em São Paulo, em 2003. Foi lá que fiz a reportagem de estreia, ainda como estudante, veiculada pela Rádio Gazeta AM.
     Conhecer pessoas, histórias e culturas sempre me fascinou. E o que mais me seduz é a possibilidade de registrar esse contato com o mundo através da palavra e da imagem. Quando comecei a trabalhar na televisão, em 2004, esse meu interesse tornou-se ainda mais latente. Desde os tempos do BandNews TV, procuro viver a pulsação da vida na rua - a matéria-prima do jornalismo. No início, como estagiário, passei a acompanhar as equipes de reportagem da Band, ao lado dos repórteres Sônia Blota e Mauro Wedekin.  Logo percebi que era aquilo que eu queria fazer. 
     Antes de trabalhar como repórter, passei por outras funções que me ajudaram na minha formação. Em 2006, após o estágio no Bandnews, fui contratado como coordenador de rede do Jornal da Band, da TV Bandeirantes em São Paulo. Lá eu vivi um dos melhores momentos da carreira, ao lado do mestre Ricardo Boechat. Aprendi a ter o discernimento crítico indispensável a um jornalista, na coordenação da pauta nacional das emissoras da Band.  Passei por momentos inesquecíveis, como a cobertura do acidente do avião da Gol, em 2006 (noticiado em primeira mão pela Band graças a uma ligação de uma fonte do Boechat, atendida por mim). Foi também no Jornal da Band que comecei a desenvolver o lado repórter - algo inerente a todo jornalista. Cheguei a ser preso, vítima da truculência de um delegado que não gostou de uma reportagem sobre o atraso na entrega dos passaportes pela Polícia Federal. Percebi que repórter não pode se intimidar diante de nenhum tipo de ameaça. Encerrei o meu ciclo na Band com uma matéria exibida em rede nacional sobre emprego em plataformas de petróleo.
     Em 2008, fui para a Rede Record, onde fiquei 4 anos como pauteiro do Jornal da Record. No início, deixei de lado o projeto da reportagem, mas jamais desisti de trabalhar na rua. Na pauta, aprendi a cultivar fontes e a desenvolver uma apuração consistente e incansável. Perdi a conta de quantas vezes peguei calhamaços de folhas de pesquisa e tirei pautas que viraram grandes reportagens para TV. Ainda na Record, passei a fazer produções especiais para o principal telejornal da emissora, no Brasil e no exterior. Trabalhei com jornalistas tarimbados, como Ana Paula Padrão, Luiz Gustavo e Luiz Carlos Azenha. Observava atentamente o jeito de cada um ao lidar com os entrevistados durante uma reportagem. Com o passar do tempo, comecei a ir para a rua, como produtor. Participei de projetos como o "Diário da Enchente", já descrito no blog. Percebi que estava na hora de me dedicar a essa antiga paixão. 
     No ano passado, abri mão da estabilidade como pauteiro de reportagens especiais do Jornal da Record e comecei como repórter da TV Diário, afiliada da Rede Globo em Mogi das Cruzes, na Grande São Paulo. Mudei de emprego, de função e de cidade. Atitude ousada e corajosa. Em quase 6 meses, fiz matérias sobre buraco de rua, crimes, esporte, culinária e a vida no campo. Vi que "reportagem não é para os fracos", como diz uma colega de profissão. Em março, fiz minha estreia em rede nacional na Globo, com um VT e um link sobre a safra do caqui, no Globo Rural. Fui batizado como repórter da maior rede de televisão do Brasil e uma das maiores do mundo. Alguns dias depois, recebi uma ligação que mudou minha carreira. Aceitei o desafio de trabalhar na EPTV, tradicional afiliada da Rede Globo no interior de São Paulo. Vou ficar na emissora de São Carlos. Mais uma vez, mudo de cidade e de emprego. Mas, agora, a função é a mesma: aquela que sempre quis exercer. Espero aperfeiçoar o meu trabalho, com ética e respeito às pessoas.


Safra do caqui em Mogi das Cruzes - Globo Rural, março/2012

sábado, 16 de janeiro de 2010

Diário da enchente: bastidores

     Morar uma semana na região alagada do extremo leste de São Paulo, na várzea do rio Tietê. A ideia da chefia do Jornal da Record chegou à equipe de produção numa sexta-feira à tarde. Ao contrário dos demais veículos de comunicação - que passavam pelo local, cobriam a tragédia e iam embora -, o objetivo da Record era eliminar o olhar externo e fazer um verdadeiro exercício antropológico: vivenciar os dramas enfrentados pela população. Os editores-executivos disseram que eu tinha sido escolhido para organizar a cobertura. Levei um susto, mas abracei o projeto.



     No mesmo dia, peguei um carro e fui até o Jardim Romano, pertencente ao Jardim Pantanal, uma das regiões mais afetadas pela enchente de 8 de dezembro de 2009. Liguei para uma líder comunitária que aceitou me guiar pelas ruas durante a minha primeira missão: alugar uma casa para a equipe de reportagem. Cheguei à região por volta de 18hs. Como as imobiliárias já estavam fechadas, abordei os moradores e bati de porta em porta atrás de um local seguro. Fechei negócio apenas no sábado, quando encontrei um quarto e um salão na parte superior de um sobrado, na rua Capachós. Depois de ter determinado onde seria a base de nossa equipe, percorri a região para ter uma ideia das dificuldades. A água do rio Tietê – misturada ao esgoto – encobria parte da rua. Também entrei em contato com outros líderes comunitários e com a polícia para que a equipe não corresse nenhum risco durante a estadia.

Contato com os novos moradores
      Na segunda-feira, toda a equipe passou a morar na região. Junto comigo, estiveram o repórter Lúcio Sturm, o cinegrafista Sandro Henrique, o auxiliar Glauco Dória, o motorista Santos e os seguranças Leandro e Jorge. Também contamos com o apoio do cinegrafista Silvio César e do auxiliar Chiquinho. Durante a semana que vivemos lá, encontramos histórias marcantes. Foi impossível não se sensibilizar com o sofrimento dessas pessoas, como a dona de casa que chegou a comer carne de cobra, os moradores de barracos na várzea do Tietê e as crianças doentes.
      Como produtor das matérias, eu me preocupei muito com o enfoque das reportagens. Além de registrar o drama das famílias, procuramos manter o espírito crítico e questionar as autoridades. Afinal, o poder público foi o principal responsável por aquela situação, ao permitir a ocupação irregular em toda a faixa de várzea do Tietê. Um dos exemplos mais absurdos é a construção de um CEU (Centro Educacional Unificado) exatamente ao lado do rio. A escola ficou totalmente alagada. Carteiras e outros móveis foram perdidos. Numa das primeiras visitas do prefeito Gilberto Kassab ao local, perguntei a ele se o prédio não tinha sido um desperdício de dinheiro público. Ele concordou que a construção realmente foi um erro, mas botou a culpa na gestão anterior, que concebeu o projeto. Kassab só não disse que a administração dele concluiu as obras, em vez de tê-las interditado.



Visitas inesperadas
     No segundo dia de matérias, a população do bairro já sabia que éramos os mais novos moradores do Jardim Pantanal. A concorrência também ficou alerta. Produtores de outro canal chegaram a sondar a mesma senhora que alugou a casa para nós.
     Sempre que íamos para a rua gravar, a população nos procurava e nos chamava pelo nome. “Rafael, você tem que mostrar isso”, “Lúcio, venha ver a minha situação”... Alguns moradores chegaram a nos fazer visitas inesperadas, em frente de casa. Um dos vizinhos era uma menina de 12 anos que trouxe uma carta. Nas linhas quase ilegíveis, ela pedia uma casa a Gugu Liberato. Outras pessoas também trouxeram cartas endereçadas ao apresentador. Quando nossa equipe voltou à Record, entreguei os papeis à produção do Gugu.
     Deixamos o Jardim Romano após a edição de sexta-feira, 18/12,  do Jornal da Record. Foi uma experiência importante para a equipe e, especialmente, para mim. Eliminamos o olhar distante e, às vezes, frio da reportagem convencional e fizemos uma incursão no dia-a-dia da população humilde do pantanal paulistano. Colocamos o pé na lama, entramos em contato direto com a comunidade e pudemos entender, de forma abrangente, um dos graves problemas sociais brasileiros.



                                                                                            Foto: Julia Chequer / R7.com


        Veja as reportagens exibidas no "Jornal da Record":
        (não tenho o link da matéria veiculada na segunda-feira, 14.12) 

Terça-feira, 15.12.09

Quarta-feira, 16.12.09

sábado, 12 de setembro de 2009

Estreia

Começo este blog no momento em que completo seis anos de carreira. Foi em 2003, ainda na faculdade, que fiz minha primeira reportagem, veiculada pela Rádio Gazeta AM de São Paulo, sobre aspectos curiosos de quem vive na comunidade de Heliópolis. Desde aqueles tempos, vi que a convergência de meios exigiria um novo perfil de jornalista para este século XXI. Não seria possível ficar alheio às novas plataformas de mídia. Depois de uma certa resistência, aqui estou. Pretendo utilizar este espaço para reportar e comentar fatos, além de registrar experiências profissionais e pessoais.